Álbum
Em plena adolescência, houve uma série de verões em que, normalmente em Setembro, os meus pais me "obrigavam" a ir passar uma semana com a minha Avó Lídia na Curia. (Filha única e neta única por um lado, nunca tive grande hipótese de não ser uma menina mimada.) Ela, uma Senhora "do antigamente", gostava de ficar no Palace Hotel, monumental, como se pode ver pelo postal, que no início dos anos 90 permanecia com aspecto igual, mas sem o glamour intrínseco de outros tempos. Chegávamos de comboio e o táxi levava-nos pela avenida larga, um túnel lindíssimo de árvores, tal como o recordo, até ao hotel. Para além disso, havia o parque "romântico" com o lago e os barquinhos, alguns restaurantes, as águas termais (decadentes, que a minha Avó nem sequer frequentava) e umas lojecas pirosas de souvenirs. Convenhamos que não eram umas férias de sonho para uma miúda com as hormonas aos saltos.
Os quartos que ocupávamos tinham passagens entre divisões. Descíamos o elevador de ferro e tomávamos o pequeno-almoço. Depois ela sentava-se à sombra junto à piscina olímpica (pelo menos era assim que eu a dimensionava), enquanto a neta queimava horas de tédio a mergulhar e a fantasiar com noites numa discoteca inexistente nas proximidades. (O episódio mais excitante de que me lembro foi quando um grupo de rapazes, uma equipa de qualquer coisa, ficou instalado durante uns dias no Hotel. Levaram um tijolo para a piscina e puseram a tocar INXS. Foram repreendidos e não voltou a acontecer. O único contacto que mantive com eles foi estritamente visual, mas sempre deu para me entreter.) Às vezes vinha alguém da família visitar-nos e partíamos de carro, de passeio até ao Buçaco, por exemplo. De regresso, jantávamos no salão à hora certa, encontrávamos as outras senhoras (com sorte, traziam também netos, era o que me ia safando), trocavam-se impressões sobre males do corpo e banalidades afins de mesa para mesa, havia a sala de televisão ("de convívio"), e depois jogava-se às cartas (ela não; ficava apenas a observar, embevecida). Dessa parte eu até gostava (sobretudo se fosse King ou Sueca), era o momento em que algumas velhotas revelavam um sentido de humor extraordinário. Nunca recolhíamos aos quartos sem antes eu conseguir escapulir-me para fumar um cigarro às escondidas ("Avó, vou só ali dar uma volta no jardim"), uma espécie de ponto de honra da minha condição adolescente. A partir de certa altura, fui dispensada do "frete". A minha Avó também deixou de ir. E foi assim que a Curia entrou para o meu arquivo.
Leio hoje no Fugas do Público que o Curia Palace Hotel, a celebrar o seu 82º aniversário, foi renovado. Agora "ainda mais exclusivo", tem "banho japonês (sentô) e piscina de jactos com som subaquático", seja lá o que isso for. Para mim, vai ser sempre o Hotel da minha Avó, de quem tenho imensas saudades.
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